Passei o
resto da tarde concentrada no trabalho. Mark adorava verbalizar
suas
ideias, o que para mim era uma ótima forma de aprendizado, e a maneira
confiante
e amigável como ele lidava com seus clientes era inspiradora. Eu o
acompanhei
em duas reuniões, nas quais ele conseguiu se impor de uma
maneira absolutamente natural e nem um pouco
ameaçadora.
Depois
partimos para uma análise das necessidades de uma fabricante de
brinquedos
para bebês, procurando cortar gastos com pouco retorno e tentando
encontrar
caminhos ainda não explorados, como anúncios em blogs sobre maternidade.
Fiquei
feliz por meu trabalho ser capaz de desviar o foco da minha
vida
pessoal, e estava ansiosa para chegar logo a hora da minha aula de krav
maga, para poder liberar uma parte daquela
agressividade reprimida.
Pouco
depois das quatro, o telefone da minha mesa tocou. Atendi sem demora
e
senti meu coração disparar ao ouvir a voz de Joseph.
“A
gente precisa sair às cinco em ponto”, ele disse, “pra chegar ao consultório
do doutor Petersen na hora marcada.”
“Ah,
é.” Eu tinha esquecido que nossas sessões de terapia de casal eram às
quintas,
às seis da tarde. Aquela seria a primeira.
Eu me perguntei se não seria também a última.
“Passo
aí”, ele continuou em um tom bem seco, “quando chegar a hora.”
Suspirei.
Estava cansada. Já bastava todo o desgaste da nossa briga. “Desculpe
ter batido em você. Eu não devia ter feito
aquilo. Sinto muito.”
“Meu
anjo...” Joseph bufou. “A única pergunta que interessa você não fez.”
Fechei
os olhos. O fato de ele sempre saber o que se passava na minha
cabeça
era bem irritante. “Enfim, isso não muda o fato de você estar guardando
segredos.”
“Com
segredos a gente consegue lidar; com traição, não.”
Esfreguei
a testa, sentindo uma dor de cabeça repentina. “Isso é verdade.”
“Você é a única pra mim, Demetria.” Sua voz
parecia firme e resoluta.
Senti
um tremor pelo corpo ao notar a fúria latente em suas palavras. Ele
ainda
estava furioso por ter sua fidelidade questionada. Mas eu também estava
furiosa. “Espero você às cinco.”
Ele
foi pontual, como sempre. Enquanto punha meu computador em modo
de
espera e pegava minhas coisas, Joseph conversava com Mark a respeito da
campanha
publicitária da vodca Kingsman. Eu o espiava de vez em quando.
Joseph
tinha uma postura imponente, com seu terno escuro e uma silhueta
magra
e musculosa, e projetava uma imagem de tranquilidade imperturbável,
apesar de eu já tê-lo visto em momentos de muita
vulnerabilidade.
O
homem por quem eu estava apaixonada era aquele, carinhoso e profundamente
emotivo.
O que eu detestava era aquela fachada, suas tentativas de
se esconder de mim.
Ele
se virou e viu que eu o estava observando. Consegui encontrar vestígios
do
meu amado Joseph em seus olhos azuis, que por um momento transmitiram
um
apelo de desejo incontrolável. Em um instante, porém, sua máscara de frieza
reapareceu. “Está pronta?”
Era
mais do que óbvio que ele estava escondendo alguma coisa, e o fato de
haver
tamanha distância entre nós era insuportável. Em determinados pontos,
ele não confiava em mim.
Quando
passamos pela recepção, Megumi apoiou o queixo na mão e soltou
um
suspiro dramático.
“Ela
está gamadinha em você, Jonas”, murmurei enquanto saíamos e ele
chamava
o elevador.
“Até
parece”, ele esnobou. “O que ela sabe sobre mim?”
“Fiquei
fazendo essa pergunta a mim mesma hoje o dia todo”, respondi em
voz
baixa.
Dessa vez, tive certeza de que ele sentiu o
golpe.
O
dr. Lyle Petersen era um homem alto, com cabelos grisalhos bem cortados
e
olhos azuis ao mesmo tempo amistosos e incisivos. Seu consultório era
decorado
com muito bom gosto, em tons neutros, e a mobília era extremamente
confortável,
algo que eu fazia questão de notar toda vez que ia até lá. Ainda não
estava
acostumada com a ideia de que ele era meu
terapeuta. Meu contato com
ele
se dava apenas através da minha mãe, que era sua paciente fazia uns dois
anos.
O
dr. Petersen se instalou em sua poltrona de costas altas diante do sofá
em
que Joseph e eu nos sentamos. Seu olhar afiado se alternou entre nós dois,
certamente
notando que estávamos mantendo certa distância e adotando uma
postura
defensiva. No trajeto de carro até lá havíamos nos comportado da
mesma maneira.
Ele
abriu a capa protetora de seu tablet, apanhou a caneta e perguntou:
“Vamos
começar falando da causa dessa tensão entre vocês?”.
Esperei
um pouco para dar a Joseph a chance de falar primeiro, mas não
me
surpreendi ao constatar que ele não tomaria a iniciativa. “Bom, nas últimas
vinte e quatro horas conheci a noiva que nem
sabia que Joseph tinha...”
“Ex-noiva”,
ele rugiu.
“...
descobri que ele só namorava morenas por causa dela...”
“Não
era namoro.”
“...
e a vi saindo do escritório dele nesse estado...”, completei, sacando o
celular.
“Ela
estava saindo do prédio”, Joseph fez questão de dizer, “não do meu
escritório.”
Abri
a fotografia que tinha tirado e entreguei o telefone para o dr.
Petersen. “E entrando no seu carro, Joseph!”
“Angus
disse no caminho pra cá que ofereceu uma carona pra ela por
educação.”
“Como
se ele fosse dizer outra coisa!”, rebati. “Ele é seu motorista desde
que
você era criança. Claro que ia te acobertar.”
“Ah, então a coisa agora virou uma conspiração?”
“O
que ele estava fazendo lá, então?”, eu o desafiei.
“Era horário de almoço.”
“E
onde você foi almoçar? Posso conferir se você estava lá e ela não, e a
gente resolve de vez esse assunto.”
Joseph
cerrou os dentes. “Eu já disse. Apareceu um compromisso de última
hora.
Acabei não indo almoçar.”
“Esse compromisso era com quem?”
“Não
era com Corinne.”
“Isso
não é resposta!” Eu me virei para o dr. Petersen, que devolveu meu
telefone
com toda a tranquilidade do mundo. “Subi até o escritório dele pra perguntar o
que estava acontecendo e o encontrei saindo do chuveiro,
quase
sem
roupa, com o sofá fora do lugar e almofadas
jogadas no chão...”
“Era
só uma almofada!”
“E
havia uma mancha de batom vermelho na camisa dele.”
“O
edifício Crossfire é sede de mais de vinte empresas”, Joseph disse com
frieza.
“Ela pode ter ido visitar qualquer uma delas.”
“Ah, sim”, respondi num tom carregado de
sarcasmo. “Claro.”
“Não
teria sido mais fácil levá-la ao hotel?”
Respirei
fundo, sentindo-me tonta. “Você ainda não desocupou aquele
quarto?”
A
máscara caiu de seu rosto, revelando sinais de pânico. A confirmação de
que
ele ainda tinha seu matadouro — um quarto de hotel usado exclusivamente
para
trepar, um lugar ao qual eu jamais voltaria — me atingiu como um soco no
estômago,
fazendo uma pontada de dor se espalhar pelo meu peito. Deixei escapar
um gemido e fechei os olhos.
“Vamos
com calma”, interveio o dr. Petersen, fazendo algumas anotações
rápidas.
“Precisamos voltar para o começo. Joseph, por que você não contou
para Demetria sobre Corinne?”
“Minha
intenção era contar”, ele respondeu, resoluto.
“Ele
nunca me conta nada”, eu disse baixinho, procurando um lenço na
minha
bolsa para não ficar com a cara toda manchada de maquiagem. Por que
ele ainda mantinha aquele quarto? A única explicação era que pretendia usá-lo
com alguém que não fosse eu.
“Sobre
o que vocês costumam conversar?”, questionou o dr. Petersen,
dirigindo-se a nós dois.
“A
maior parte do tempo eu estou me desculpando”, resmungou Joseph.
O
dr. Petersen o encarou. “Por quê?”
“Por tudo.” Ele passou a mão pelos cabelos.
“Você
acha que Demetria exige demais de você?”
Senti
que Joseph estava virado para mim. “Não. Ela nunca me pede nada.”
“A
não ser a verdade”, corrigi, virando-me para ele.
Os
olhos dele brilhavam, fazendo minha pulsação acelerar. “Nunca menti
pra você.”
“Você
quer que ela peça alguma coisa, Joseph?”, perguntou o dr. Petersen.
Joseph
franziu a testa.
“Pense
nisso. Depois voltamos a esse assunto.” O dr. Petersen voltou sua
atenção
para mim. “Essa fotografia me deixou intrigado, Demetria. Você se deparou
com
uma circunstância que a maioria das mulheres considera profundamente
desgastante...”
“Não
houve circunstância nenhuma”, Joseph reafirmou sem se alterar.
“Houve
a percepção de uma circunstância”, especificou o dr. Petersen.
“Uma
percepção claramente ridícula, considerando nossa relação.”
“Certo.
Vamos falar sobre isso, então. Quantas vezes por semana vocês
fazem sexo? Em média.”
Fiquei
vermelha. Olhei para Joseph, que retribuiu meu olhar com um sorrisinho
malicioso.
“Humm...”
Contorci os lábios. “Muitas.”
“Todos
os dias?” O dr. Petersen ergueu as sobrancelhas quando me viu
descruzar
e cruzar de novo as pernas, concordando com a cabeça. “Várias vezes
por dia?”
O
dr. Petersen largou o tablet no colo e olhou para Joseph. “E esse nível de
atividade
sexual é seu padrão?”
“Nada
no meu relacionamento com Demetria está dentro dos meus padrões,
doutor.”
“Com que frequência você fazia sexo antes de se
envolver com Demetria?”
Joseph
cerrou os dentes e se virou para mim.
“Pode
falar”, incentivei, apesar de saber que não gostaria de responder a
essa mesma pergunta na frente dele.
Ele
estendeu a mão, diminuindo a distância entre nós. Pus minha mão
sobre
a dele e gostei de sentir seu aperto reconfortante. “Duas vezes por semana”,
ele disse com firmeza. “Em média.”
Fiz
uma conta rápida de cabeça para tentar determinar a quantidade de
mulheres. A mão que estava no meu colo se fechou.
O
dr. Petersen se recostou na poltrona. “Demetria manifestou preocupações de
infidelidade
e falta de comunicação no seu relacionamento. O sexo costuma ser
usado como uma forma de resolver os
desentendimentos?”
Joseph
ergueu as sobrancelhas. “Antes que você venha me dizer que Demetria
está
sendo vítima da minha libido desmedida, saiba que ela toma a iniciativa
tanto
quanto eu. Se alguém aqui precisa se preocupar com a viabilidade de
manter
o ritmo, esse alguém sou eu, por causa das especificidades da anatomia
masculina.”
O
dr. Petersen me olhou, à espera de uma confirmação.
“A
maioria das interações entre nós termina em sexo”, concordei, “inclusive
as brigas.”
“Antes
ou depois de o conflito ser considerado superado por ambas as
partes?”
Soltei um suspiro. “Antes.”
Ele
pegou a caneta e começou a escrever na tela sensível ao toque. Já havia
material
para um romance inteiro depois de tudo o que tinha sido dito ali.
“Seu
relacionamento tem esse caráter altamente sexualizado desde o início?”,
ele perguntou.
Concordei
com a cabeça, mesmo sabendo que ele não estava olhando.
“Sentimos uma atração muito forte um pelo outro.”
“Claro.”
Ele tirou os olhos da tela e abriu um sorriso simpático. “Ainda assim,
gostaria
de discutir a possibilidade de abstinência enquanto...”
“Fora
de questão”, interrompeu Joseph. “Se for assim, é melhor nem
começar.
Sugiro que a gente se concentre nas coisas que não estão dando
certo,
em
vez de eliminar uma das poucas que estão.”
“Não
sei se está funcionando tão bem assim, Joseph”, disse o dr. Petersen.
“Não
como deveria.”
“Doutor...”
Joseph apoiou um dos tornozelos sobre o joelho e se recostou
no
assento em uma postura de quem estava irredutível. “O único jeito de me
fazer
resistir a ela é me matando. Tente encontrar outra maneira de fazer a gente
dar certo.”
Posta maaais hoje!! Depois desta derrota vergonhosa do brasil, fiquei tao feliz em ver q vc tinha postado. Please posta mais
ResponderExcluirCADEEEE
ResponderExcluirFic maravilhosa
Postaaaaa!!!!